Resolução n.º 5806
RECURSO. PEDIDO DE CRIAÇÃO DE LOCAL DE VOTAÇÃO. PRELIMINAR DE INTEMPESTIVIDADE RECURSAL. PRAZOS. PROCESSO ADMINISTRATIVO. ARTIGO 59 DA LEI N. 9.784/99. 10 DIAS. EXAME EM CONJUNTO COM O MÉRITO. SENTENÇA. INCOMPETÊNCIA. INDEFERIMENTO. EQUÍVOCO. ARTIGO 64, § 3º, DO CPC. NORMA COGENTE. REMESSA. JUÍZO COMPETENTE. NULIDADE. RECONHECIMENTO DE OFÍCIO.
- O processo trata de recurso contra decisão de indeferimento de pedido de criação de local de votação feito por moradores de localidade.
- O prazo recursal, quando não se trata de matéria administrativa, a não ser quando há disposição específica, é de 10 (dez) dias, conforme o teor do art. 59 da Lei n. 9.784/99 (Lei do Processo Administrativo).
- A intempestividade recursal pode ser transposta quando se observar, no caso concreto, que se trata de situação no qual se verifica ser o processo caracterizado pelo informalismo, sem contencioso algum e cuja sentença recorrida recaiu em flagrante nulidade.
- A providência a ser tomada quando se constatar a incompetência de determinado juízo, é o encaminhamento ao juízo competente, e não o indeferimento do pedido (inteligência do art. 64, § 3º, do CPC).
- Sentença anulada de ofício e encaminhamento dos autos ao juízo competente para apreciação do pedido.
RESOLVEM os Juízes Membros do Tribunal Regional Eleitoral do Pará, à unanimidade, reconhecer de ofício a nulidade da decisão prolatada pelo Juízo da 40ª ZE e determinar a remessa dos autos para a 35ª ZE, nos termos do voto da Relatora, a Juíza Rosa de Fátima Navegantes de Oliveira. Votaram com a Relatora o Desembargador José Maria Teixeira do Rosário, o Juiz Federal José Airton de Aguiar Portela e os Juízes Marcus Alan de Melo Gomes, Rafael Fecury Nogueira e Tiago Nasser Sefer. Presidiu o julgamento o Desembargador Leonam Gondim da Cruz Júnior.
Sala das Sessões do Tribunal Regional Eleitoral do Pará.
Belém, 25 de abril de 2024.
Juíza Rosa de Fátima Navegantes de Oliveira
Relatora
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL ELEITORAL DO PARÁ
RECURSO ELEITORAL (11548) - 0600017-28.2024.6.14.0040 - Tucuruí - PARÁ.
RECORRENTE: MARLENE DE MELO MACHADO.
RELATÓRIO
A Senhora Juíza Rosa de Fátima Navegantes de Oliveira: Trata-se de recurso interposto por Comunidades Angelim I e II e Pirassununga, ID 21511141, contra decisão prolatada pelo Juízo da 40ª Zona Eleitoral (Tucuruí) que indeferiu pedido de instalação de seção eleitoral na Comunidade Angelim no bojo do Proc. Sei n. 0002257-95.2024.6.14.8040. O requerimento foi indeferido devido a que a referida comunidade se localiza no município de Baião e, desse modo, a 40ª ZE não teria jurisdição para designar a criação de seção eleitoral.
Os recorrentes afirmaram, em síntese, que:
- “os critérios para definição do local de votação levam em consideração, sobretudo, o local de domicílio do eleitor. Reporta-se que o pedido de criação da nova seção eleitoral, objeto do recurso, foi subscrito por 112 (cento e doze) eleitores domiciliados na Comunidade Angelim I e II e Pirassununga, número superior ao mínimo exigido pelo Código Eleitoral, em seu art. 117”;
- “a legislação pertinente demonstra certa flexibilidade, a considerar que uma ZE pode abranger mais de um município ou mesmo parte de um município. Assim, não há que se vincular o território do município à jurisdição da ZE ou do Juízo Eleitoral”;
- “ o conceito de domicílio eleitoral adotado pelo TSE tem sentido bem amplo”;
- “a população residente ao longo da Rodovia Transcametá, até a altura do Km 50, e até mais, tem estreitas ligações com o município de Tucuruí, no que ser refere à utilização de serviços públicos, com destaque para a utilização dos serviços de saúde”;
- “indeferir a criação de seção eleitoral em uma escola pública da Comunidade Angelim I e II e Pirassununga, é submeter os eleitores da ZE 40 ali domiciliados às dificuldades que enfrentam há décadas, para o exercício da cidadania”.
A Procuradoria Regional Eleitoral apresentou manifestação, ID 21513301, da seguinte forma, em resumo:
- preliminarmente, o recurso é intempestivo, pois a “a intimação dos interessados sobre a decisão recorrida ocorreu em 15/03/2024, mas o recurso só foi interposto em 01/04/2024 (id 21511141 - Pág. 3), logo, após o prazo recursal de três dias”;
- no mérito, “a decisão recorrida id 21511129 merece ser mantida por seus próprios fundamentos, na medida em que o Juízo da 40ªZE não tem competência jurisdicional no Município de Baião para que possa criar e instalar uma seção eleitoral (local de votação)”.
Por fim, opinou pelo não conhecimento ou não provimento recursal.
É o relatório.
VOTO
A Senhora Juíza Rosa de Fátima Navegantes de Oliveira (Relatora): A Procuradoria Regional suscitou preliminar de intempestividade, entretanto, a questão possui certa complexidade que impele o julgador a tratá-la com o mérito, conforme ficará esclarecido nesta fundamentação.
O objeto deste processo é de natureza administrativa: cuida de criação de local de votação em comunidade, pedido feito pelos próprios moradores. A natureza jurídica do processo é importante para se delimitar qual prazo recursal se aplica. A PRE entendeu que o prazo é de três dias; mas não houve especificação do motivo pelo qual adotou tal parâmetro. Possivelmente, filiou-se ao prazo comum recursal dos processos judiciais eleitorais (art. 258 do Código Eleitoral).
O Código Eleitoral no capítulo correspondente à criação de locais de votação, estipula, de fato, um prazo recursal de três dias, mas se trata de algo bastante específico: recurso contra a decisão que deliberou sobre a reclamação contra outro decisório sobre o tema. Veja-se:
Art. 135. [...].
§ 7º Da designação dos lugares de votação poderá qualquer partido reclamar ao juiz eleitoral, dentro de três dias a contar da publicação, devendo a decisão ser proferida dentro de quarenta e oito horas.
§ 8º Da decisão do juiz eleitoral caberá recurso para o Tribunal Regional, interposto dentro de três dias, devendo no mesmo prazo, ser resolvido.
Devido à especificidade da disposição acima, o prazo correto aplicável só pode ser o geral do processo administrativo, ou seja, dez dias, conforme reproduzo dispositivo da Lei n. 9.784/1999 (Lei do Processo Administrativo):
Art. 59. Salvo disposição legal específica, é de dez dias o prazo para interposição de recurso administrativo, contado a partir da ciência ou divulgação oficial da decisão recorrida.
Assim, em atenção ao prazo de dez dias, constata-se que a intimação por whatsapp (ID 21511137) feita a uma das moradoras subscreventes da petição de criação de local de votação Valquiria Ribeiro Pereira (vide relação de moradores, IDs 21511133 e 21511111) foi feita em 15 de março de 2024 (sexta-feira), logo a contagem iniciou em 18 de março de 2024 (segunda-feira). O prazo finalizaria em 27 de março, quarta-feira da Semana Santa, data na qual não há expediente da Justiça Eleitoral, logo foi prorrogado para o dia 1º de abril (segunda-feira). O recurso apenas foi interposto em 5 de abril de 2024 (ID 21511141), portanto, a rigor, estaria intempestivo.
Poder-se-ia discutir a validade da intimação a uma das moradoras, ainda mais porque não há nos autos documento algum que a designe como representante deles (diferentemente do recurso, o pedido também não é assinado por advogado). Valquiria Ribeiro Pereira é apenas a primeira subscritora da peça contentora do pedido de criação do local de votação. Entretanto, pelo que se observa deste procedimento, é que se trata de algo bastante informal e, assim, não se observam motivos para não se aceitar a intimação como válida, além do que não seria razoável se exigir que todos os moradores subscreventes do pedido fossem intimados - são ao todo 112 (cento e doze) pessoas.
Toda essa explanação foi para que a Corte ficasse a par de todas as situações fático-processuais constatáveis nos autos. Tendo em vista as premissas circunstanciais, é que passo ao meu entendimento decisório sobre a questão.
A rigidez jurídica levaria de forma imediata ao não conhecimento do recurso devido à intempestividade. O que se observa para além é que a decisão recorrida foi pelo indeferimento do pedido ao entender que não possui jurisdição em localidade do município de Baião, já que a competência era no município de Tucuruí. Entretanto, ao simplesmente indeferir o pedido, o Juízo da 40ª ZE não obedeceu a prescrição processual civil (o CPC possui aplicação subsidiária no processo administrativo) que ordena que, ao se considerar incompetente, o juiz deve remeter o processo para o competente. Veja-se:
Art. 64. A incompetência, absoluta ou relativa, será alegada como questão preliminar de contestação.
[...]
§ 3º Caso a alegação de incompetência seja acolhida, os autos serão remetidos ao juízo competente.
A prescrição é cogente, o que resulta também que o descumprimento dela gera nulidade ao processo reconhecível de ofício. Por todos esses aspectos, pelo processo ser caracterizado intrinsecamente pelo informalismo, pela inexistência de contencioso, o que se soma o princípio da primazia do mérito, a posição mais acertada é anular a decisão e determinar a remessa para o Juízo da 35ª ZE - Baião.
Isso posto, RECONHEÇO DE OFÍCIO A NULIDADE da decisão prolatada pelo Juízo da 40ª ZE e, em consequência, determino a remessa dos autos para a 35ª ZE para que possa decidir a questão.
É o voto.
Belém, 25 de abril de 2024.
Juíza Rosa de Fátima Navegantes de Oliveira
Relatora
* Este texto não substitui o publicado no DJE TRE-PA, em 08/05/2024